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terça-feira, 1 de outubro de 2024

Pobre de Direita: Por que as pessoas mais simples preferem candidatos que não as representam

Faltam apenas cinco dias para as eleições municipais, e uma questão ressurge com força: o fenômeno do "pobre de direita". Esse termo, popularizado e detalhado pelo sociólogo Jessé Souza em seu recente livro "O Pobre de Direita", lançado no Instituto Conhecimento Liberta (ICL), busca explicar como indivíduos das classes menos favorecidas acabam se alinhando politicamente com quem, em tese, não defende seus interesses.

Para compreender este fenômeno, é fundamental considerar aspectos históricos e culturais que moldam o comportamento eleitoral no Brasil. Jessé Souza argumenta que a preferência de pessoas pobres, negras, indígenas e mulheres por candidatos que, na prática, não representam seus interesses se baseia numa combinação de fatores sociais, econômicos e emocionais. Mas o que está por trás dessa escolha?

Uma Síndrome de Estocolmo Social? (paixão pelo algoz)

Muitos analistas comparam esse comportamento a uma "Síndrome de Estocolmo" social e política, na qual eleitores acabam se identificando com seus opressores. Ao longo da história do Brasil, a desigualdade foi normalizada e romantizada. Para muitos, submeter-se ao discurso dos "vencedores" da sociedade — aqueles que prometem ordem e crescimento, mesmo que às custas do bem-estar social — parece ser o único caminho possível para fugir da pobreza. Essa assimilação da ideologia dos dominantes cria uma espécie de lealdade ao opressor, dificultando o reconhecimento de alternativas que realmente beneficiem os mais vulneráveis.

Além disso, a subserviência cultural e o ressentimento em relação às próprias origens fazem com que a pessoa busque se dissociar daquilo que simboliza a sua "falta de valor" aos olhos da sociedade. Nesse contexto, há a falsa ideia de que as políticas de assistência social ou de proteção às minorias mantêm as pessoas em uma situação de dependência, impedindo-as de "progredir". Esse discurso é amplamente promovido pela mídia conservadora, que ainda influencia de maneira decisiva a opinião pública, principalmente nas regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos.

A Venda de Votos e o Ciclo da Miséria

Outro fator crucial que Jessé Souza aponta é a venda de votos. Ela não acontece apenas pela troca de dinheiro ou bens materiais, mas pela própria promessa ilusória de inclusão que candidatos de direita oferecem aos mais pobres. O mercado político da troca de favores mantém os eleitores dependentes e prisioneiros de uma relação de poder assimétrica, que legitima candidaturas com agendas neoliberais, que, na prática, reduzem a capacidade do Estado de promover o bem-estar social e combater desigualdades.

Com isso, cria-se um ciclo difícil de ser quebrado: a falta de educação política leva à escolha de candidatos que, uma vez eleitos, perpetuam a exclusão e a ausência de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da população mais vulnerável. Essa escolha contribui diretamente para que a miséria se perpetue, e a mudança que poderia ocorrer através do voto acaba sendo apenas uma reafirmação do status quo.

Impactos nas Eleições Municipais

O impacto desse fenômeno nas eleições municipais é profundo, já que é justamente a partir do legislativo municipal e das políticas locais que se constroem as primeiras barreiras contra a desigualdade. A escolha de vereadores e prefeitos que ignoram a realidade da população pobre cria uma ausência de políticas públicas efetivas na saúde, educação e moradia, áreas em que os mais vulneráveis são mais dependentes. Além disso, a identificação com discursos elitistas e conservadores afasta o eleitor da crítica necessária às estruturas de poder locais, mantendo um cenário político injusto e excludente.

Caminhos para Minimizar a Situação

O campo progressista e a esquerda precisam adotar estratégias para romper com esse ciclo, oferecendo educação política que leve à consciência crítica. Mais do que discursos ideológicos, é necessário se aproximar da realidade concreta da população. Iniciativas que promovam a discussão sobre os problemas cotidianos — falta de saneamento, escolas mal equipadas, postos de saúde sem atendimento — e ofereçam soluções reais, de forma clara e acessível, têm maior chance de atrair esses eleitores.

Em tempos de redes sociais, o papel do ativismo digital é igualmente fundamental. Ao invés de combater diretamente o discurso conservador, é mais eficaz evidenciar como as políticas de inclusão, cooperativismo e valorização da economia local são as que, de fato, resultam em melhorias concretas para o dia a dia do cidadão. Nesse sentido, é preciso deixar clara a ligação entre o candidato que está sendo eleito e os interesses das comunidades.

O que os eleitores precisam buscar em um candidato é a autenticidade, o compromisso com a melhoria coletiva e uma trajetória que demonstra envolvimento real com as lutas das pessoas comuns. É necessário não apenas eleger "quem promete mudança", mas quem comprova, por ações passadas, ser capaz de promover essas mudanças.


Curso, baseado no Livro O Pobre de Direita, disponível  na platataforma de o Instituto Conhecimento Liberta! 
Sobre o autor e professor Jessé Souza

Graduado em Direito e mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília, doutor em Sociologia pela Universidade de Heidelberg (Alemanha). Pós-doutorado em Psicanálise e Filosofia na The New School of Social Research (Nova York). É autor de mais de 20 livros, de artigos e ensaios em vários idiomas. Entre suas principais obras se destacam A classe média no espelho; A tolice da inteligência brasileira, A radiografia do golpe e Subcidadania brasileira; Ralé brasileira e Como o racismo criou o Brasil. Jesse Souza foi presidente do IPEA. Atualmente é professor titular de sociologia na Universidade Federal do ABC – UFABC.

A Força da União e do Cooperativismo:

O cooperativismo e a união comunitária são ferramentas poderosas para enfrentar a exclusão social e econômica. Quando comunidades se organizam em prol do bem comum, criam oportunidades que o poder público muitas vezes negligencia. Buscar candidatos que apoiem e promovam cooperativas e formas de organização comunitária é uma forma de garantir que políticas públicas sejam direcionadas à autonomia e ao fortalecimento da sociedade como um todo.

Oiran Braga – jornalista 

Facebook, Instagram e Bluesky @oiranbraga 

“Seja autêntico, respeite a Criação, a Pesquisa e a Autoria, mas por favor mantenha os créditos.(Sobre Plágio leia a Lei 9.610/98)”

 

4 comentários:

  1. Não é muito fácil debater sobre o assunto! Mas o texto é oportuno, pois trás uma realidade nua e crua... quando vemos o descalabro que é a mercantilização do voto... Em minha cidade, por exemplo é comum ver as pessoas trocando seu direito sagrado de participar do processo Democrático, por uma ninharia (não que o preço se justifique): sempre comparo, compra/venda de voto com a prostituição do direito! Candidato que oferece algo pelo seu voto, não o merece... e se compra, não tem compromisso... Parabéns pela postagem; fazia tempos que não via uma postagem em blogs neste formato... hoje tudo é no ganha-ganha! É bacana ver alguém, que, pelo visto têm uma boa bagagem e bons textos. Desejo que continue... Ah também sou seguidor do ICL - Brasil e assisti o lançamento do Livro Pobre de Direita - do Professor Jessé Souza, por isso o tema me chamou muito a atenção....

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  2. Puea realidade em Boa Vista -RR, Os pobres de direita e o analfabetismo político inundam o nosso meio.

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  3. Prática comum em Roraima, e também no Brasil.

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  4. O pobre tem não tem o direito de ser da vertente que ele quiser então?

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